quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Trailers malditos

Odeio os malditos traillers mas não consigo deixar de vê-los.

Em 1998, quando Godzilla estreou nos cinemas, lembro-me de ter ficado imensamente satisfeito com a campanha de marketing que precedeu seu lançamento. Os teasers (pequenas cenas que acabam não revelando muita coisa do que estaria por vir) lançados na ocasião, afinal, mostraram-se bem melhores que o próprio filme em si. Entretanto, apesar de naquela época Hollywood já ter se transformado em um caça níquel voraz que, na maioria das vezes, tem como objetivo arrecadar milhões em detrimento da qualidade das obras, hoje em dia isso tem se potencializado.

Historicamente, a indústria do cinema sempre pareceu evoluir em prol do lucro e não da arte em si que, via de regra, tende-se a manter estagnada (???). Vimos isso com a mudança dos formatos de projeção e razão de aspecto, que justificou-se para atrair para os cinemas o público da TV; com o cinema 3D, que dificulta a pirataria.

Atualmente, o que vemos nos trailers é uma necessidade de mostrar para o espectador tudo de bom que há no filme, para se certificar de que fique bem claro para ele o que ele perderá caso não assista. Assim, os trailer costumam ser um Frankenstein de cenas importantes e desconexas, que muitas vezes acabam por prejudicar a experiência final do entusiasmado que costuma gostar de ser surpreendido.

Ora, se há, durante a projeção, uma cena em que a personagem X está na iminência de morrer ou perder um órgão vital ou etc, logo pensamos que tal fato não acontecerá porque uma das cenas que você viu no trailer ainda não passou no filme, e na cena a personagem estava incólume e/ou viva. E a lógica é aplicada para tudo, se pensarmos bem: objetos, animais, lugares.

O ideal seria que o trailer passasse antes pelo crivo dos diretores, que decidiriam o que mostrar e o que não mostrar de sua obra. Aliás, seria melhor que o trailer fosse uma extensão do trabalho do diretor e dos atores, que poderiam gravá-lo como um material a parte, o que seria muito mais interessante. Hitchcock fez isso com alguns de seus filmes. Em um de seus trailers, ele apenas apresenta o M(H)otel Bates para o público, mostrando o quarto e banheiro onde Marion seria assassinada. Aproveitou para dar uma alfinetada nos poderosos de Hollywood, que estavam receosos acerca da cena do vaso sanitário, onde a secretária manda para o esgoto uma prova de seu crime (o primeiro vaso sanitário mostrado pelo cinema de Hollywood). No trailer, Hitchcock pede ao espectador redobrada atenção ao objeto, dizendo para o público que algo muito importante aconteceria devido a ele. Uma estratégia de marketing genial, vinda de um dos maiores gênios que o cinema já conheceu.

O problema é que, apesar de tudo o que aleguei acima, acaba sendo um trabalho hercúleo não assistir a um trailer. Isso ocorre porque, para o amante de cinema, tal mídia exerce o fascínio de ser geralmente o primeiro contato que iremos ter com a tão esperada obra pronta, pelo menos no quesito cinético. Conseguiremos ter uma noção melhor da impressão final do trabalho e conseguiremos, para o bem ou para o mal, criar uma expectativa. O infortúnio disso é que muitas das vezes, tal expectativa acaba nos prejudicando também. Assim, o trailer completa sua saga de acabar se revelando o verdadeiro presente de grego que o cinema tem a nos oferecer. Um presente poderoso, levando em consideração seu tempo tão escasso.
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